Cientistas brasileiros desenvolvem sensor para identificar anticorpos contra Covid
03/11/2022
Testes rápidos, baratos e precisos continuam sendo essenciais para que os serviços de vigilância em saúde monitorem e contenham a disseminação do vírus SARS-CoV-2 e pesquisadores desenvolveram um sensor capaz de ajudar nesse objetivo. O trabalho foi considerado relevante na área e teve destaque ao estampar a capa da revista ACS Biomaterials Science and Engineering.
Para desenvolver esse novo método diagnóstico o grupo utilizou um material usualmente conhecido na área de metalurgia, o óxido de zinco, combinado de forma inédita com o FTO, um vidro condutor de elétrons. “Por meio dessa combinação inusitada e acrescentando uma biomolécula, a proteína viral Spike, foi possível desenvolver uma superfície com capacidade de detecção de anticorpos contra o vírus SARS-CoV-2. A leitura do resultado se dá pela captação de sinal eletroquímico na superfície desenvolvida”, explica o químico Wendel Alves, professor do Centro de Ciências Naturais e Humanas da Universidade Federal do ABC (UFABC) e autor principal do artigo.
O eletrodo criado detectou anticorpos contra o novo coronavírus em amostras de soro em cerca de cinco minutos, com índice de sensibilidade de 88,7% e especificidade de 100%. Os resultados revelaram número de acertos até maiores que o do teste convencional ELISA (ensaio de imunoabsorção enzimática), padrão-ouro empregado atualmente.
O trabalho contou com apoio da FAPESP por meio do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Bioanalítica (INCTBio) e de um Projeto Temático. Alves, que desenvolve pesquisas no Laboratório de Eletroquímica e Materiais Nanoestruturados (LEMN) da UFABC, conta que o conhecimento de propriedades químicas, como o ponto isoelétrico da proteína Spike do SARS-CoV-2, permitiu desenvolver uma plataforma em que ela ficasse retida por meio da ligação eletrostática com os nanobastões de óxido de zinco. Esse composto, aliás, tem sido cada vez mais utilizado na produção de biossensores por causa de sua versatilidade e propriedades químicas, ópticas e elétricas diferenciadas.
De fácil produção e utilização, o imunossensor tem também custo de fabricação relativamente baixo. “Ele foi viabilizado graças ao emprego do forte conhecimento do grupo de pesquisa sobre novos materiais e a habilidade de sintetizar nanobastões de óxido de zinco, os chamados ‘nanorods’, modificando a superfície de um vidro condutor, o FTO”, detalha Alves. Esse processo permitiu criar um microambiente molecular favorável para a imobilização da proteína viral Spike sobre a superfície eletrocondutora, transformando essa construção em um dispositivo simples para detecção de anticorpos contra o SARS-CoV-2.
A perspectiva do grupo é adaptar a plataforma para torná-la portátil, permitindo a conexão de dispositivos móveis para facilitar a detecção de anticorpos contra a Covid-19 e outras doenças infecciosas.
Para os testes, foram analisadas 107 amostras, divididas em quatro grupos: pré-pandemia (15); convalescentes de COVID-19 (47); vacinados sem resultado positivo anterior para a doença (25); vacinados com resultado positivo anterior (20). Os vacinados haviam recebido duas doses de CoronaVac, com quatro semanas de intervalo entre elas.
Um dos destaques ressaltados pelos pesquisadores é que os anticorpos detectados na plataforma desenvolvida podem ser tanto de infecção pelo coronavírus quanto de resposta imunológica induzida por uma vacina. Essa segunda aplicação é bastante importante para auxiliar as ações de saúde pública ao monitorar a eficácia de diferentes programas e campanhas de vacinação.
O trabalho é assinado por pesquisadores da UFABC e do Instituto do Coração (InCor) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP), que apontam a importância desse monitoramento das taxas de soroconversão e soroprevalência da imunidade gerada após vacinação. O dispositivo está atualmente validado para detecção de imunidade induzida pela CoronaVac, mas o grupo pretende expandir para testar também a resposta de outros fabricantes, como Pfizer e AstraZeneca.
Uma das vantagens do eletrodo desenvolvido é sua arquitetura flexível, tendo potencial para outras aplicações biomédicas e de diagnóstico a partir de adaptações e personalizações. “A tecnologia gerada é uma plataforma de biossensoriamento versátil. Com o domínio dessa tecnologia é possível modificá-la e customizá-la para detecção sorológica de outras doenças de interesse para a saúde pública”, aponta Alves.
*Com Bahia Notícias
Foto: Science Photo Library