Empresa dos Estados Unidos é acusada de manipular resultados de remédio para Alzheimer
28/07/2022
O Departamento de Justiça dos Estados Unidos abriu uma investigação contra a Cassava Sciences Inc para apurar se a empresa de biotecnologia manipulou resultados de pesquisas para seu medicamento experimental contra o Alzheimer, disseram duas pessoas familiarizadas com o inquérito à Reuters.
Os agentes do Departamento de Justiça que conduzem a investigação são especializados em examinar se companhias e indivíduos enganaram ou fraudaram investidores, agências governamentais ou consumidores, de acordo com as fontes, que falaram sob condição de anonimato.
As fontes não forneceram detalhes sobre o foco do inquérito. Como em qualquer investigação do Departamento de Justiça, esta pode levar a acusações criminais ou ser encerrada sem representações.
Em uma declaração por e-mail, Kate Watson Moss, advogada que representa a empresa, não confirmou nem negou a existência da investigação.
“Para ser claro: a Cassava Sciences nega veementemente toda e qualquer alegação de irregularidade”, disse Moss, acrescentando que a empresa “nunca foi acusada de crime e por boas razões – a Cassava Sciences nunca se envolveu em conduta criminosa”.
A representante acrescentou que agências governamentais solicitaram o envio de informações para a companhia, mas se recusou a identificar essas agências. Ela destacou que “a Cassava Sciences forneceu informações em resposta a essas solicitações em plena satisfação de suas obrigações legais” e que nenhuma órgão acusou a empresa de irregularidades.
Questionado pela Reuters, um porta-voz do Departamento de Justiça se recusou a comentar o caso.
A empresa já estava enfrentando escrutínio da Comissão de Valores Mobiliários dos EUA e investidores depois que dois médicos de fora da Cassava fizeram alegações, no ano passado, de manipulação de dados e deturpação envolvendo pesquisas que sustentam o medicamento da empresa para Alzheimer, chamado Simufilam.
A Cassava é uma empresa com cerca de duas dúzias de funcionários, que, em um comunicado no ano passado, chamou as acusações de “falsas e enganosas”.
O site da companhia descreve o Simufilam como uma “abordagem totalmente nova” para o tratamento da doença de Alzheimer, a forma mais comum de demência e um distúrbio cerebral progressivo que afeta quase 6 milhões de americanos.
A medicação oral restauraria a forma e a função normais de uma proteína-chave no cérebro, segundo a descrição.
Petição ao FDA
A investigação criminal começou algum tempo depois que uma petição foi apresentada, em agosto de 2021, ao Food and Drug Administration (FDA) dos EUA, segundo as fontes.
A representação foi levada por Jordan Thomas, um advogado que representa dois médicos, que pediu à agência que suspendesse os ensaios clínicos do Simufilam.
Os profissionais de saúde são David Bredt, neurocientista que trabalhou na Janssen, e Geoffrey Pitt, cardiologista que atua como diretor do Instituto de Pesquisa Cardiovascular da Weill Cornell Medicine, em Nova York.
Thomas disse que os estudos publicados de Cassava sobre ensaios clínicos envolvendo Simufilam em vários periódicos continham deturpação de dados e imagens de experimentos que pareciam ter sido manipulados por software de edição de fotos. A FDA negou a petição e deixou os julgamentos prosseguirem.
Bredt e Pitt divulgaram em novembro do ano passado, em um artigo publicado pelo “The Wall Street Journal”, que venderam ações da Cassava, apostando que o preço cairia assim que os investidores soubessem da manipulação que alegavam.
Mais tarde, eles disseram à revista “The New Yorker” que não têm mais uma “posição vendida” em Cassava, uma afirmação que a Reuters não pôde verificar de forma independente.
A venda a descoberto (outro termo para “posição vendida”, é a prática de vender ações em um curto prazo prevendo desvalorização) representa “um grande conflito de interesses”, disse Watson Moss, a porta-voz da Cassava, em seu comunicado à Reuters.
“A Cassava Sciences está interessada em ajudar aqueles com doença de Alzheimer, não é um dia de pagamento fácil”, acrescentou.
Queda das ações
As ações da Cassava caíram vertiginosamente após a petição apresentada à FDA por Thomas, apresentando uma oportunidade para Bredt e Pitt lucrarem com sua aposta contra a empresa.
Thomas se recusou a comentar o assunto.
Em fevereiro, o FDA disse que a representação apresentada pelos dois médicos pedindo que iniciasse uma investigação sobre o Simufilam não era um caminho adequado para tal solicitação.
A agência complementou que os pedidos para que iniciasse uma ação são “expressamente excluídos do escopo dos procedimentos de petição de cidadãos da FDA”, acrescentando que exerce sua própria discrição em tais assuntos.
Um porta-voz do FDA se recusou a comentar o caso.
As ações da Cassava subiram na Nasdaq de cerca de US$ 7 em janeiro de 2021 para mais de US$ 135 em julho de 2021, com as esperanças dos investidores de que a empresa estivesse à beira de um avanço no tratamento da doença de Alzheimer. As ações despencaram semanas depois, após a notícia da petição questionando os resultados da pesquisa.
As ações da companhia fecharam a US$ 21,72 nesta terça-feira (26).
A Cassava recebeu mais de US$ 20 milhões (R$ 105 milhões) dos Institutos Nacionais de Saúde dos EUA para apoiar o desenvolvimento do Simufilam.
O Instituto Nacional de Saúde americano informou à Reuters que não discute possíveis casos de má conduta em pesquisa relacionados a subsídios, mas que os funcionários “levam a conduta em pesquisa muito a sério”.
“A má conduta em pesquisa pode distorcer as decisões de financiamento do NIH, a integridade geral da pesquisa que apoiamos e a confiança do público na ciência e resultados”, observou.
A Cassava Sciences também está enfrentando a investigação da Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos (SEC), disseram as fontes. Em novembro passado, o “Wall Street Journal” noticiou pela primeira vez a investigação da SEC, pontuando que a agência estava examinando as alegações feitas na petição da FDA.
A Reuters não conseguiu determinar quais alegações específicas, se reais, atraíram o escrutínio da agência.
Um porta-voz da SEC disse que a agência “não comenta a existência ou inexistência de uma possível investigação”.
*Com CNN Brasil
Foto: Divulgação