Pesquisa da Fiocruz confirma transmissão sexual do vírus zika em Pernambuco
27/10/2020
Uma pesquisa realizada pela Fiocruz Pernambuco, em colaboração com a Universidade Estadual do Colorado (CSU) dos Estados Unidos, encontrou evidências científicas da importância da transmissão sexual do vírus na epidemia de zika em Pernambuco.
Trata-se do primeiro estudo brasileiro a chegar a essa conclusão e o segundo no mundo a demonstrar que transmissão sexual do vírus da zika tem um papel muito mais importante na epidemia do que se estimava inicialmente. O primeiro foi realizado em Porto Rico (2019).
Outras investigações anteriores já haviam comprovado a existência desta forma de transmissão em localidades sem a presença do mosquito vetor, o Aedes aegypti e sem indicar qual a sua relevância na epidemia.
O estudo pernambucano aponta que essa contribuição é significativa. “A via sexual não parece ser unicamente responsável pelo contágio sustentado do zika, mas associada à transmissão pelo mosquito pode contribuir significativamente para a disseminação eficiente do vírus”, explica a pesquisadora Tereza Magalhães (CSU e Fiocruz PE), que coordenou o projeto, ao lado dos pesquisadores Ernesto Marques (Fiocruz PE e Universidade de Pittsburgh, EUA) e Brian Foy (CSU). A pesquisa contou com financiamento do National Institutes of Health (NIH).
Realizado por Tereza e Ernesto entre maio de 2015 e maio de 2016, esse estudo recrutou pacientes atendidos na UPA de Paulista (PE) com sintomas sugestivos de dengue. O trabalho foi realizado em colaboração com o pesquisador da Universidade de Heidelberg (Alemanha) e CSU, Thomas Jaenisch.
O resultado foi surpreendente, pois, ao final das análises, 60% dentre os mais de duzentos e cinquenta pacientes estudados foram casos confirmados de infecções com os vírus zika e chikungunya, sendo pouquíssimos casos de dengue. Portanto, esse estudo se revelou um importante registro do período final da epidemia de zika e do posterior crescimento dos casos de chikungunya em Pernambuco, doenças que haviam se instalado silenciosamente na população.
A partir desse conhecimento acumulado, foram convidados os participantes dessa pesquisa anterior (denominados index), seus parceiros sexuais e até mais dois moradores da mesma residência, formando uma coorte de 425 pessoas.
O objetivo foi comparar, através de sorologia, a exposição prévia dos participantes aos vírus zika e chikungunya. A hipótese era que a exposição ao zika seria maior entre os parceiros sexuais, já que esse vírus é transmitido por sexo e pela picada do mosquito.
A comparação com o chikungunya foi muito importante no estudo já que não é transmitido sexualmente (somente pela picada do mosquito).
Foram coletadas amostras de sangue, realizados testes sorológicos e aplicados questionários, para responder a dois tipos de análise.
Primeiro foi avaliado o risco da pessoa ser positiva para zika ou chikungunya quando morando com paciente index soropositivo para o respectivo vírus, sendo ela parceira sexual ou não. Depois, esse mesmo risco foi observado em todos os pares de uma mesma residência, independente de serem formados pelo paciente index.
Os resultados apontaram que, no caso do zika, o risco de ter sido exposto ao vírus foi significativamente maior para o parceiro sexual do que para o morador no mesmo espaço que não era parceiro sexual.
Para chikungunya, utilizado nessa pesquisa como controle, o resultado foi bem diferente e o risco se mostrou igual para todos os moradores .
Na segunda parte das análises, os pares sexuais das residências tiveram uma maior probabilidade de terem sorologia concordante para o zika do que os pares sem relação sexual, fato que não foi observado com o grupo chikungunya.
O estudo mostrou que a transmissão sexual do zika em áreas endêmicas, associada à transmissão vetorial, pode ter sido um dos fatores responsáveis pela rápida disseminação do vírus nas Américas e em outras regiões afetadas pela pandemia em 2015/2016.
Fonte: Fiocruz