Pacientes com AIDS e outras ISTs estão há um ano sem atendimento em Salvador
26/11/2021Entidades de defesa dos direitos das pessoas com HIV/AIDS, HTLV (vírus linfotrópico da célula humana) e outras infecções sexualmente transmissíveis denunciam a falta de atendimento, durante a pandemia de Covid-19, nas três unidades do Serviço de Atendimento Especializado de Salvador. Vivendo com a defasagem de infectologistas na equipe médica, o Grupo de Pares Marymar Novais, a Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV e AIDS (RNP), a associação HTLVida, o Grupo de Apoio A Prevenção A Aids (GAPA) e o projeto Drags da Prevenção pretendem fazer um ato na próxima quarta-feira, 1.
“Para as pessoas que descobrem que estão com HIV, nada é fácil até que a família e os amigos saibam. O atendimento é crucial e evita sofrer micro violências, porque a pessoa convive com outras, e fazem pontes que o médico às vezes não consegue acessar. Os SEA’s são um território de acolhimento”, explica o fotográfo Ton Shübber, voluntário do Gapa.
No caso da HTLV, as pessoas convivem com a inexistência da cura e sem atendimento ficam suscetíveis a doenças oportunistas. “Sem o tratamento, as pessoas acabam definhando”, Francisco Borges, presidente da HTLVida. Algumas pessoas hegam a desenvolver problemas na coluna, afetando a locomoção.
Sem atendimento, os pacientes com melhores condições financeiras buscam a rede privada de saúde. “Acessar o serviço privado não é fácil. Isso tudo gerou uma onda de ativistas e estamos juntos”, adverte. Além da transferência dos infectologistas para os setores de atenção à Covid-19, os profissionais encontram melhores condições salariais no atendimento privado.
De acordo com Francisco Borges, a HTLVida esteve em contato com a Secretaria Municipal de Saúde (SMS), na qual o titular Léo Prates explicou os desafios para a renovação das equipes. Em junho deste ano, outras entidades buscaram novas informações para a situação, mas sem sucesso.
Em Salvador, os atendimentos concentram-se no SAE Marymar Novaes, no bairro Dendezeiros, o SAE São Francisco, em Nazaré, e o SEMAE (Servico Municipal De Assistencia Especializada), na Liberdade.
Segundo o A Tarde, reportagem desta matéria buscou informações com a SMS, mas até o momento de fechamento do texto, não obteve retorno. Na carta aberta, os grupos de defesa dos direitos apontam que foi apontada a chance de inserir clínicos gerais nos SEA’s, mas os entrevistados reiteram que a presença de infectologistas é crucial. As entidades acionaram na última quitna, 25, o Ministério Público do Estado.
Atendimento com infectologistas na pandemia
“Desde o início da pandemia não conseguimos assistência. O atendimento deveria ser de semestral. Uma tuberculose, por exemplo, pode levar a morte de uma pessoa sem tratamento da HTLV”, explica Borges.
“Pessoas infectadas pelo HIV devem ser vacinadas para evitar infecções oportunistas e a escolha do antígeno adequado, esquema mais apropriado para cada indivíduo”, defende a Sociedade Brasileira de Infectologia, em nota no dia 28 de setembro deste ano.
Em entrevista ao UOL Notícias, em abril deste ano, o consultor da SBI, José Valdez Ramalho Madruga, explicou que o contato de pessoas com HIV/AIDS com infectologistas durante a pandemia auxiliou no acompanhamento do tratamento, revalidando receitas em alguns casos para evitar retornos aos postos de saúde. “Atualmente, estamos observando grande número de casos de covid nos portadores de infecção HIV, inclusive com formas mais graves e que necessitam de internação hospitalar”, explicou.
Perfil das pessoas
Segundo o Boletim Epidemiológico de HIV/AIDS, feito pelo Ministério da Saúde, em 2019, a região Nordeste reúne a maioria das pessoas convivendo com a doença no Brasil, com aproximadamente 14,7 mil pessoas, cerca de 35% do total. Em 2020, entre as mulheres, nota-se que 86,6% foram infectadas naquelas que integram casais heterossexuais.
“A maioria que vivem são homens homossexuais ou bissexuais. Desde o início da pandemia, o grupo com maior crescimento são mulheres casadas com mais de 40 anos. Jovens são grandes vítimas, por falta de informação”, explica Shübber.
Os dados também apontam que no período de 2007 a 2020, mais da metade das infecções registradas no Sinan (Sistema de Informação de Agravos de Notificação) ocorreram entre pessoas negras. Salvador é a 18º com mais casos detectados de 2015 a 2019.
Segundo o Boletim Epidemiológico HTLV, de 2019, da Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (SESAB), 88% dos casos concentraram-se em Salvador, de 2012 a 2019. De acordo com o Ministério da Saúde, no Brasil existem hoje 800 mil pessoas estão infectadas com HTLV.
Na média global, pelo menos 5% dos portadores desenvolvem manifestações clínicas graves e com prognóstico reservado como a leucemia.
*Por Mariana Gomes – A Tarde
*Foto: SAE /Marymar Novais