PF vê indícios de ‘pressão’ para favorecer empresa na gestão de Barros na Saúde

PF vê indícios de ‘pressão’ para favorecer empresa na gestão de Barros na Saúde

24/09/2021 0 Por Redação

 

A Polícia Federal afirmou à Justiça Federal ter reunido elementos que indicam ter havido “pressão” de integrantes do Ministério da Saúde durante a gestão do deputado Ricardo Barros (PP-PR) para o pagamento antecipado de quase R$ 20 milhões à empresa Global Saúde pela compra de remédios para doenças raras que nunca foram entregues.

Representação da PF obtida pela TV Globo reúne depoimentos de servidores do ministério que atribuem a liberação da verba a cobranças do próprio Ricardo Barros e de pessoas ligadas ao gabinete dele, além de mudanças, introduzidas durante a gestão do então ministro nos processos de aquisição de medicamentos comprados por decisão judicial.

O material reunido pela Polícia Federal foi a base da Operação Pés de Barro, realizada na última terça-feira (21). A operação apura fraudes na aquisição de medicamentos de alto custo pelo Ministério da Saúde, entre maio de 2016 e março de 2018, período em que Barros — atual líder do governo de Jair Bolsonaro na Câmara dos Deputados — comandava a pasta, durante o governo do então presidente Michel Temer. Na operação, a PF cumpriu mandados de busca e apreensão em quatro estados (Alagoas, Minas Gerais, Pernambuco e São Paulo) e no Distrito Federal.

Em nota, o deputado Ricardo Barros afirmou que não é alvo da operação e que não cometeu nenhuma irregularidade durante o período que foi ministro da Saúde. “Na minha gestão no Ministério promovi uma economia superior a R$ 5 bilhões com a renegociação de contratos, compras de medicamentos e insumos. Todos os valores foram reinvestidos no SUS. São processos que afrontaram grandes interesses, mas promoveram mais serviços à população”, diz Barros na nota (leia a íntegra ao final desta reportagem).

O caso

A contratação envolve a empresa Global Saúde, sócia da Precisa Medicamentos – arrastada para o centro das investigações da CPI da Covid após suspeitas de irregularidades nas tratativas de compra da vacina indiana Covaxin.

A Polícia Federal informou à Justiça que não estava investigando o caso Covaxin, mas que os fatos revelados pela CPI mostram que o mesmo grupo investigado na Operação Pés de Barro pode ter perpetuado um esquema para desviar dinheiro público.

Segundo a PF, as medidas de busca e apreensão eram necessárias diante da exposição dos alvos pela CPI, que poderiam agir para destruir provas, e de indícios dos crimes de estelionato, falsidade ideológica, corrupção ativa e passiva, prevaricação, advocacia administrativa e organização criminosa.

Sem citar o nome de Barros, o delegado José Augusto Versiani afirmou que o esquema não seria comandado por Francisco Maximiano, dono da Global e da Precisa, mas por alguém com “influência política” (leia ao final desta reportagem nota dos advogados de Maximiano, da Global e da Precisa).

“Sabe-se que a subtração de dinheiro público não foi coordenada por Francisco Emerson Maximiano, mas por alguém que tinha influência política para efetuar nomeações no ministério da saúde, os quais operavam pressionando servidores para que empresas fossem favorecidas e procedimentos de compra e pagamento fossem efetuados fora da legalidade”, afirmou.

O depoimento do servidor Victor Lahud cita diretamente a suposta interferência de Barros.

Ele afirmou aos investigadores que antes do pagamento houve muita pressão dos superiores para a liberação dos valores e que se recusou por entender que não estavam preenchidos os requisitos para justificar a antecipação do pagamento.

Segundo relata a representação da PF, “as cobranças partiram do Sr. Alexandre Lages, bem como de outras pessoas ligadas ao gabinete, alegando sempre que o Diretor, Davidson Tolentino, e o próprio Ministro, Ricardo Barros, estavam cobrando que fosse feito esse pagamento”.

De acordo com a reprodução do relato do servidor à PF, “todos os telefonemas que recebia com cobranças para que efetivasse o pagamento antecipado à empresa Global Gestão em Saúde S/A mencionavam o nome do ministro Ricardo Barros como forma de pressionar para que fosse feito o pagamento”.

Segundo Ricardo Barros, as informações do servidor são inverídicas. “São informações que não condizem com a verdade. Não fiz pressão a qualquer servidor para autorizar o pagamento. O depoimento de Victor Lahud fala em pressão usando o meu nome, mas nunca pressão diretamente minha. Inclusive não consta no processo autorização ministerial para o pagamento antecipado à empresa Global como reconhece o Ministério Público na denúncia. Reforço que a licitação seguiu o trâmite legal com decisões judiciais favoráveis. Estou tranquilo e provarei a minha inocência”, afirmou.

Outra servidora, Liana Martins, afirmou que não faz parte do procedimento normal do Ministério da Saúde “o pagamento antecipado de fornecedores, sendo a compra de um fornecedor nacional”.

Nota do deputado Ricardo Barros

Leia abaixo a íntegra de nota divulgada pelo deputado federal Ricardo Barros.

Nota Oficial Operação da Polícia Federal

“Não se comprovará qualquer irregularidade na minha conduta no Ministério da Saúde”, diz Ricardo Barros

Reitero que não sou alvo da operação e não se comprovará qualquer irregularidade na minha conduta à frente do Ministério da Saúde. Na minha gestão no Ministério promovi uma economia superior a R$ 5 bilhões com a renegociação de contratos, compras de medicamentos e insumos. Todos os valores foram reinvestidos no SUS.

São processos que afrontaram grandes interesses, mas promoveram mais serviços à população.

As compras foram feitas dentro das normas legais, sob decisões judiciais favoráveis e provocaram mudança na posição da Anvisa, que deixou de exigir licença de importação para medicamentos judicializados.

Sobre o caso Global, reitero que o prazo de entrega dos medicamentos venceu após a minha saída do ministério em Abril de 2018. O atraso não tem relação com as mortes citadas.

A ação fazia parte de um processo de enfrentamento dos monopólios do setor farmacêutico, especialmente na compra de medicamentos para atendimento de doenças raras em cumprimento a decisões judiciais.

A política de quebra de monopólios consistia em buscar a proposta mais vantajosa aos cofres públicos, de menor preço, independente de quem fosse o vendedor do medicamento.

Buscou-se aumentar o número de concorrentes, com apoio da Justiça, e utilizar a possibilidade de pagamento antecipado para redução de preços, prática admitida pelo Tribunal de Contas da União.

No caso da empresa Global, foram adotadas todas as providências pelo Ministério da Saúde para penalização da empresa e para o ressarcimento ao erário. A Global já confessou a dívida e ressarciu até agora cerca de R$ 2,8 milhões ao Erário.

Nota da Global Saúde

Leia abaixo a íntegra de nota divulgada na terça-feira (21) pelos advogados de Francisco Maximiano, da Precisa Medicamentos e da Global Saúde.

A operação de hoje reproduz de forma escancarada o modus operandi e ilegal da Lava Jato, ao usurpar competência do Supremo Tribunal Federal, investigar fatos antigos, sem qualquer contemporaneidade e prova de ilegalidade, com o único objetivo de conseguir os holofotes da imprensa e aproveitar o clima de violações a garantias fundamentais que lamentavelmente vem se instaurando novamente no país, no curso das investigações que versam sobre a pandemia.

Não obstante a Precisa Medicamentos e seus executivos tenham sempre se colocando à disposição das autoridades e entregue todos os documentos quando solicitados, prestados todas as informações requeridas, ido à CPI três vezes, prestado três depoimentos à PF, dois à CGU, hoje a empresa é alvo da terceira busca e apreensão em menos de um ano e a segunda em uma semana.

Lamentavelmente, isso demonstra o retorno do estado policialesco que, assim como na Lava Jato, quando foram feitas reiteradas e sufocantes medidas cautelares deferidas contra investigados que posteriormente foram absolvidos por essas nulidades, mas tiveram suas empresas quebradas, ou prejudicadas de forma quase irreversível, mas em todos os casos sempre tiveram seus negócios atingidos e empregos destruídos naquele malfadado período.

Ticiano Figueiredo e Pedro Ivo Velloso, advogados de Francisco Maximiano, Precisa Medicamentos e da Global Saúde.

 

*Fonte: G1

*Foto: Geraldo Magela/Agência Senado